O amor desconcertante de Deus
- Fr. Rodrigo Costa Silva - Província do Rio de
- 13 de jun. de 2016
- 3 min de leitura

“Misericordiosos como o Pai” é o lema do Ano Santo da Misericórdia, aberto pelo Papa Francisco no dia 08 de dezembro de 2015, solenidade da Imaculada Conceição, e que se estenderá até a solenidade litúrgica de Jesus Cristo, Rei do Universo, 20 de novembro de 2016. De acordo com as palavras do próprio Papa Francisco, este Ano Santo“ é um tempo favorável para todos nós, para que contemplando a Divina Misericórdia, que supera todo limite humano e resplandece sobre a obscuridade do pecado, possamos nos tornar testemunhas mais confiantes e eficazes”. Trata-se de um convite para que todos os fiéis se abram a experiência da misericórdia divina (cf. Mt 11,28s.), “perfeição da essência divina”[1], que toca a nossa fraqueza humana, salvando-a, e tornando-nos testemunhas da proximidade misericordiosa do Pai.
Jesus, através de seus gestos e palavras, nos revela que o rosto de Deus é misericórdia. E mais, “Jesus não Se limita a anunciar a mensagem de misericórdia do Pai – também a vive” (Mc 1,41; Lc 7,13; Mt 15,32). No evangelho de Lucas, encontramos talvez, a mais profunda formulação da mensagem da misericórdia do Pai. Em Lc 15,11-32, encontramos a narrativa evangélica comumente conhecida como a “parábola do filho pródigo”, no entanto, a figura de destaque desta parábola não é a do filho rebelde, masa do pai. Seria melhor chamá-la, então, de “parábola do Pai Misericordioso”, pois nela somos convidados a reconhecer o amor e o perdão incondicionais do pai, figura do amor do próprio Deus que não cessa de correr ao encontro de seus filhos perdidos, oferecendo-lhes o seu perdão e sua misericórdia.
Como sabemos, a primeira parte da parábola descreve a atitude do filho mais novo, que resolve separar-se do pai para ser autônomo, para isso pede-lhe a herança, envolve-se numa vida de esbanjamento e devassidão, que o levaram a uma situação extrema e degradante. Nesse momento de absoluta miséria e humilhação, começa o processo de retorno do filho à casa paterna. Ao ver de longe o filho, o pai se compadece, corre ao seu encontro, o abraça e cobre de beijos (cf. Lc 15,20), superando todas as expectativas humanas. O filho espera tornar-se um empregado do pai, mas este é acolhido novamente, recebe túnica nova, anel e sandálias. O pai restaura a sua dignidade de filho, de ser humano.Encontramos aqui, a revelação de amor desconcertante, que desafia nossa lógica humana, pois o pai subverte os costumes vigentes em nome de sua bondade: “A misericórdia do pai ultrapassa toda a medida esperada. Não se orienta pela justa distribuição de bens materiais, mas sim pela dignidade filial. É esse o critério do amor”[2].
Quanto ao filho mais velho, incapaz de acolher a bondade do pai e de perdoar, revela profundamente nossas atitudes e pensamentos, porque representa a nossa pequenez, marcada pela raiva e pelo ciúme, que não nos permite aceitar que Deus pode agir assim, gratuitamente, sem pedir nada em troca. De acordo com o filho mais velho, o pai comete um erro atrás do outro, pois é ele quem deveria levar a maior parte da herança, já que o serve há tantos anos; e ainda, o pai não deveria ter feito o que fez, já que o filho mais novo acaba na mais completa miséria por levar uma vida libertina e dissoluta. Em outras palavras, o filho mais velho, assim como nós, não pode suportar que a misericórdia possa ultrapassar tamanha medida. Nesta parábola, se conta a nossa própria história, pois somos ao mesmo tempo, filhos transviados e mesquinhos, necessitados de conversão para que possamos redescobrir o rosto misericordioso e desconcertante de Deus Pai.
“Sede misericordiosos, como o vosso Pai é misericordioso ” (Lc 6, 36). Esta obra-prima do Evangelho de Lucas nos convida a entrarmos na dinâmica do amor desarmado de Deus e participarmos de sua alegria, assumindo um estilo de vida que nos permita sermos reflexo do amor misericordioso e subversivo de Deus para com nossos irmãos. Só “misericórdia de Deus leva o ser humano a ‘regressar a verdade acerca de si mesmo’”[3]. Desta forma, viveremos uma nova lógica, cujo horizonte é o próprio amor sem limites de Deus por nós.
[1] KASPER, Walter. A misericórdia: condição fundamental do Evangelho e chave da vida cristã [tradução: Beatriz Luiz Gomes]. 2.ed. São Paulo: Edições Loyola; Portugal: Princípia Editora, 2005,p. 90.
[2]Idem,p. 92.
[3] Ibidem, p. 92.
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