Sagrado, Mistério e Saudade
- Gedson Pablo
- 21 de jun. de 2016
- 2 min de leitura
“Fizeste-nos para ti e inquieto está nosso coração, enquanto não repousa em ti”.
Confissões. Santo Agostinho.

Vivo a nostalgia do Sagrado que ainda pulsa em mim. Tal como a mãe que vive “a saudade [enquanto] o revés do parto” e “arruma o quarto do filho que já morreu”. Ecoa da memória o mistério do Deus-menino que fugiu do céu. “Ele é o divino que sorri e que brinca”. No silêncio do coração entoo um hino ao Amor que venceu a morte. E, ainda nos altares, elevo uma oração pelo seu retorno.Navego através do tempo olhando e rindo para as estrelas, pois “elas me fazem rir”.
Enquanto isso, eu recordo de antigamente. Antigamente é este “tempo que se foi, mas que se recusa a ir de vez e fica dentro da gente, atormentando o coração com saudade”. Sinto cheiro do biscoito feito no fogão à lenha na casa de Pedro, meu avô. Véspera de São João. Se Jesus fosse lá na roça ia querer café do bule e pão de queijo quentinho. Essa prosa fez lembrar-me do místico Riobaldo do Grande Sertão: Veredas, que dizia:
A gente se encostava no frio, escutava o orvalho, o mato cheio de cheiroso, estalinho de estrelas, o deduzir dos grilos e a cavalhada a peso. Dava o raiar, entreluz da aurora, quando o céu branquece. [...]. E o senhor me desculpe, de estar retrasando em tantas minudências. Mas até hoje eu represento em meus olhos aquela hora, tudo tão bom; e, o que é, é saudade.
Saudade só pode ser mistério de Deus que deixa nosso coração inquieto. Por isso, para mim saudade é a face do Sagrado. Mistério que continua mistério, mas que acena feito lembranças antigas. Como canta o profeta Isaías: “Vossa lembrança e vosso nome, ó Senhor, são o desejo e a saudade de noss’alma!”. Cântico de Isaías 26, 8-9. Olho no espelho e depois contemplo uma fotografia. Aquele sou eu e não sou eu, este sou eu, mas não serei, sendo. Mistérios do tempo que guarda no tique-taque as saudades de um vir-a-ser criança, jovem e adulto. Mistério do Sagrado. Saudade do Mistério. Sagrado e Saudade. Trilogia da minha oração. Filosofia da minha vida. Poesia do meu silêncio nostálgico de um tempo que já passou. Presença escondida de um Deus que me ama.
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